Em um cenário econômico em constante transformação, o mercado de capitais ganha nova relevância. O momento de retomar ofertas públicas promete marcar um capítulo decisivo na trajetória de empresas brasileiras e investidores.
O Brasil viveu uma seca histórica de iniciativas de abertura de capital entre 2021 e 2023. A última grande estreia, da Wilson Sons em 2021, deixou claro o impacto combinado de juros altos e ambiente político instável na confiança dos investidores.
Em 2024, menos de dez empresas conseguiram ingressar na B3, refletindo um cenário macroeconômico desafiador que combinou Selic elevada, pressões inflacionárias e incertezas sobre reformas fiscais. Esse contexto impediu que muitos potenciais emissores avançassem para as etapas finais de estruturação.
No entanto, o segundo semestre de 2024 trouxe sinais de aquecimento gradual. Processos junto à CVM começaram a ganhar ritmo, indicando que empresas de diferentes portes e setores veem na bolsa uma alternativa estratégica de financiamento.
Quando comparado a mercados latino-americanos, como México e Chile, o Brasil mostra sinais de recuperação, mas ainda carece de maior previsibilidade jurídica e tributária. A abertura de capital tornou-se um termômetro da saúde macroeconômica e da atratividade para capitais estrangeiros.
Para 2025, analistas apontam para uma onda de ofertas que pode superar a casa das vinte estreias, caso o governo mantenha disciplina fiscal e o Banco Central preserve a política monetária em níveis compatíveis com a estabilidade de preços. O fluxo de recursos externos, por sua vez, dependerá da capacidade de atrair investidores globais por meio de governança corporativa robusta.
Além dos fatores internos, o ambiente internacional, marcado por tensões comerciais e pressões de política monetária nos Estados Unidos e Europa, impacta diretamente o apetite por novos IPOs no Brasil. A desaceleração chinesa, por exemplo, afeta o setor de commodities, criando volatilidade nos papéis de empresas exportadoras.
Diversos segmentos despontam como protagonistas nessa fase de reabertura do mercado. Energia, varejo, tecnologia, alimentação e saúde estão na linha de frente, oferecendo oportunidades de diversificação para portfólios.
Cada um desses players traz consigo uma narrativa de expansão e fortalecimento de operações. O setor de energia, por exemplo, busca atender à crescente demanda por soluções logísticas e renováveis, enquanto o varejo investe em omnichannel e fidelização de clientes.
No segmento alimentício, o Madero aposta na valorização de marcas locais e certificações de qualidade, buscando replicar o sucesso em franquias. A Senior Sistemas, por sua vez, foca em inovação em gestão empresarial para atrair investidores interessados em tecnologia aplicada a processos corporativos.
Além das grandes companhias, as fintechs representam um movimento disruptivo. Seus modelos de negócio escaláveis e base tecnológica consolidada chamam atenção de fundos internacionais.
Empresas como CVC Corp e Biorc também preparam novos movimentos, refletindo a maturidade de setores como turismo e biotecnologia, respectivamente. A diversidade de candidatos mostra um mercado mais dinâmico e menos dependente de um único setor.
O tema ESG (environmental, social and governance) ganha cada vez mais força em processos de IPO. Empresas que adotam práticas sustentáveis e transparência ambiental atraem fundos de investimento comprometidos com responsabilidades socioambientais.
No varejo online, empresas de e-commerce que desenvolvem logística própria e marketplaces verticalizados ganham destaque. Investidores avaliam a rentabilidade unitária e escalabilidade como indicadores-chave para decidir pela compra em IPO.
Paralelamente, o ambiente internacional se mostra receptivo. O volume de IPOs nos EUA ultrapassou US$ 25 bilhões em 2024 e projeta alcançar US$ 30 bilhões ao final do ano. Nessas condições, de seis a sete empresas brasileiras planejam estrear na Nasdaq em 2025.
Plataformas de tecnologia e fintechs lideram a lista de candidatas, aproveitando a visibilidade global e as condições de liquidez mais atrativas. A listagem na Nasdaq exige padrões elevados de compliance e divulgação, mas compensa com maior capilaridade de investidores institucionais.
Entre os primeiros casos de sucesso, destacam-se bancos digitais que optaram por listagens paralelas, combinando ofertas na B3 e na Nasdaq para maximizar a captação. Essa estratégia exige um equilíbrio entre padrões regulatórios de diferentes jurisdições, mas amplia a base de acionistas e fortalece o valuation.
A listagem na Nasdaq também abre espaço para que as empresas adotem padrões avançados de divulgação, incluindo relatórios trimestrais mais detalhados e aderência a frameworks internacionais como IFRS e SOX. Esse alinhamento regulatório, embora custoso, oferece credibilidade global aprimorada e maior proteção a investidores.
Caso de cross-listing, empresas optam por manter ações negociadas simultaneamente na B3 e na Nasdaq, potencializando o fluxo de negociadores e garantindo arbitragem entre mercados, o que pode reduzir spreads e aumentar liquidez.
Para investidores, o momento é propício para avaliar companhias em estágios variados de maturidade. Desde empresas em expansão acelerada até as que buscam consolidação de mercado, há espaço para diversificação e construção de carteiras temáticas.
Por outro lado, os desafios não podem ser subestimados. A volatilidade geopolítica, a oscilação das taxas de juros e as mudanças nas políticas fiscais podem impactar o timing e a performance pós-IPO.
Já para as empresas, a jornada do IPO representa um esforço integrativo entre equipes internas, bancos coordenadores e órgãos reguladores. A qualidade da governança, a divulgação transparente de resultados e a criação de um prospecto sólido são elementos determinantes para o sucesso.
Um exemplo recente de sucesso é o da CVC Corp, que, ao retornar à bolsa em 2022, reforçou sua governança ao implementar comitês independentes e políticas ESG. Essa iniciativa resultou em maior confiança dos investidores e valorização de mercado.
O horizonte de 2025 é repleto de promessas e desafios. Se por um lado a recuperação global dos mercados e o avanço de setores tecnológicos criam um ambiente favorável, por outro a necessidade de ajustes internos exige disciplina e foco.
Um ponto central será a evolução das estruturas de compliance e controles internos. Empresas que investirem em processos robustos, auditorias independentes e comunicação clara com o mercado estarão mais bem posicionadas para extrair valor de suas ofertas públicas.
Outra tendência é o uso de inteligência artificial e big data para estruturar ofertas. Bancos de investimento utilizam algoritmos avançados para modelar cenários, precificar ações e identificar o perfil ideal de investidor. Essa tecnologia pode reduzir custos de emissão e acelerar processos de due diligence.
Para investidores, acompanhar roadshows, ler prospectos e participar de webinars promovidos pelas empresas em processo de IPO são práticas recomendadas para obter insights diretos da gestão e avaliar riscos.
Para investidores, a recomendação é construir portfólios diversificados, contemplando diferentes setores e geografias. A combinação de ativos brasileiros e listings internacionais pode equilibrar risco e retorno de forma eficiente.
Ao final, o sucesso desse ciclo de IPOs dependerá da sinergia entre empresas, reguladores e participantes do mercado. Com visão de longo prazo e compromisso com a transparência, o ecossistema de capitais brasileiros e latino-americanos tem a chance de escrever um novo capítulo de inovação e crescimento.
Referências